"Amor" por Relógios
Aqui na cidade de Salvador era um caso sério, tinha muitos amantes de relógios, essa peça preciosa deixou de ser uma ferramenta para o cotidiano para ser parte do vestuário.
Só que esse amor podia ser muito perigoso, pois os que "amam" demais os relógios alheios não se controlavam, passando a fazer diversas falsetas em prol do "amor" pelo alheio.
O dia que eu percebi o amor incontido por esse contador de horas, foi quando era adolescente, fui pegar uma paquera na escola e nos conduzimos ao coletivo, como naquela época a gente entrava pela frente e saía por trás, era uma beleza para esses apaixonados pelo "bobo", a gente estava logo no banco que ficava na frente da porta de saída, a "traseira" como dizem aqui, foi quando uma mão escura passou como furacão, puxando o relógio de Adriele, ela se assustou e eu mais rápido ainda peguei o dito cujo pelo pulso, ele logo soltou a peça e saiu pulando igual a canguru, saltando do carro, foi um susto só, melhor para mim que ainda saí de herói e depois fica a cargo da sua imaginação a premiação.
Aqui no dia dois de julho é muito especial, o festejo é maior que Sete de Setembro, pois as pessoas comemoram a Independência da Bahia, que sacramentou a Independência do Brasil, é muita gente na rua, muita comemoração, mas os perseguidores de relógios ficavam mais espertos, até agressivos, Wilton meu amigo que o diga, saiu com o seu relógio que só faltava falar e gritar por socorro, quando um cara de quase dois metros deu um soco em seu rosto que só faltou jogá-lo ao chão, eu me preparei para a briga, mas o cara se mandou e meu amigo ficou com o rosto inchado igual a um limão, coitado, ele passou dias se lamentando e sonhando com uma carreta passando encima do bandido.
Como quem tem, tem medo, eu tomava bastante cuidado ao sair com meu Cássio com secretária eletrônica, pois quando ia para a guerra era um Deus nos acuda!
Tentaram várias vezes me roubar, era gente passando correndo e tentando puxá-lo do meu pulso, gente fingindo estar aramado para roubar o favorito, saía até na mão, mas não abria mão do precioso.
Até que um dia caí na maior armadilha, do namorado deslumbrado, aquele que presta atenção no amor e esquece-se do resto; ao sair do cinema um incauto segurou no meu ombro e me cumprimentou, ao olhar para trás ele puxou o relógio e saiu correndo, eu desci atrás dele correndo pela Carlos Gomes, e depois entrei numa ladeira, mas como o lugar era escorregadio e eu estava de sapato, escorreguei e vi o meu "garoto" ir embora...
Fiquei muito chateado e passei um tempo para esquecer, até comprar outro igualzinho, mas os "amantes" cresceram na sua sanha e a perseguição começou, até que novamente cair na estória do namorado apaixonado, eu já sabia disso, sofri na pele, mas não imaginava a ginástica que aquele cara ia fazer para roubar o meu "novinho", ele entrou no ônibus, passou por baixo da catraca, - nessa época, já entrávamos por trás –viu o meu relógio, saiu do mesmo veículo, entrou de novo no carro, aproximou-se da catraca onde eu estava após o cobrador, "bafou" o meu novinho e desceu por trás, eu fiquei sem ação, sendo assaltado dentro do ônibus, naquela época era um absurdo, ninguém roubava dentro de coletivo, era o lugar mais seguro do mundo, não era como hoje, que tem um ladrão em cada esquina e em cada ponto.
Sei que depois dessa procurei rapidinho o meu sossego, comprando um relógio de um real, saindo na maior tranquilidade.
Essa tranqüilidade perdurou, porque ninguém queria relógio, a moda agora é celular, uma nova história de amor.
Marcelo de Oliveira Souza
Marcelo de Oliveira Souza site: http://marceloescritor2.blogspot.com
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